
APLICAÇÕES TERAPÊUTICAS
Espasticidade associada à esclerose múltipla ou lesões da espinal medula
Dependendo da doença pode atuar de formas diferentes.
Na Esclerose lateral amiotrópica (ALS), que é uma patologia que afeta essencialmente os neurónios motores da espinal medula e do tronco, tendo uma evolução muito rápida. Há vaárias teorias que tentam explicar a patofisiologia da doença, sendo de destacar o danos oxidativo, bloqueio do transporte axonal através dos neurofilamentos, toxicidade causada por agregados intracelulares e a excitotoxicidade mediada pelo glutamato. Para além disto observou-se que nesta patologia há uma desregulação dos recetorores canabinóides, havendo um grande aumento dos recetores CB2 a nível central, mantendo-se os CB1.
Pelo que parece os canabinóides pela sua ação ns recetores canabinóides, causam uma retardação na progressão da doença, pelas suas propriedades anti-inflamatórias e antioxidantes. Na prática o uso de cannabinoides ajuda a diminuir a sintomatologia associada à patologia como a dor, espasticidade, babar, falta de apetite e sono pela sua atuação em vias neuronais múltiplas.
Têm ainda uma segunda grande área de ação nesta patologia, que é ajudar a relaxar, induzir euforia e diminuir a ansiedade, já que esta patologia têm uma elevada correlação com depressão e ansiedade, que ao serem reduzidos melhoram muito a qualidade de vida dos pacientes. [1]
Esclerose múltiplas (EM)
Patologia crónica em que há a desmielinização progressiva dos neurónios do sistema nervoso central e periférico, estando associada a uma trasnmissão neuronal inapropriada ou descontrolada, que piora gradualmente com a evolução da doença.
O uso de cannabinoides nesta patologia é para a redução da sua espasticidade, que foi observada em modelos animais estar associada a uma ação ao nível dos recetores CB1 e não CB2. Parece que este efeito é devido aos efeitos neuroprotetores que os cannabinoides têm, pela sua ação nas células de glia. [1]
A melhoria da espasticidade parece estra associada à sua ligação ao rectore CB1 pré-sinático, que diminui a libertação massiva de glutamato pelos neurrónios glutamatérgico, ajudando na regulação da excitabilidade glutamatérgica durante a espasticidade. Por outro lado, a sua ação anti-inflamatóriaa é importante por ajudar a reduzir a libertação e circulação de fatores pro-inflamatórios. [2]
Apesar do seu uso, inicialmente mostrar uma melhoria da espasticidade, o seu uso crónico mostrou aumentar os impedimentos cognitivos, sendo que um estudo demosntrou que o uso crónico de cannabis em pacientes com EM tinham o dobro da probabilidade de serem considerados “cognitivamente impedidos” quando comparados com pacientes que não usavam cannabinóides. Nesse mesmo estudo mostraram uma correlação entre o impedimento cognitivo e a redução do volume da matéria branca e cinzenta em várias zonas do cérebro, como o tálamo, região temporal, região pré-frontal e gânglios da base. [1]
Náuseas e vómitos associados à quimioterapia, radioterapia e terapeia combinada de HIV com medicação HVC
e
Estimulação do apetite nos cuidados paliativos de doentes sujeitos a tratamento oncológico ou com SIDA
Os canabinóides ativam os rectores CB1 no SNC e são inibidores alostéricos do recetores 5HT3, por esta sua ação combinada diminuem a emese num nível central, mas com uma potência não muito elevada.
No entanto, estes são os únicos antieméticos que para além de diminuir a emese, conseguem promover a hiperfagia, ou seja, o aumento do consumo calórico diário total, porque têm capacidade de ativar os rectores CB1 no hipotálamo. [2]
Dor crónica associada a doenças oncológicas e do sistema nervoso, como dor neuropátrica por lesão de um nervo, dor do membro fantasma, neuralgia do trigémio ou após herpes zooster
Dor crónica é uma grade preocupação mundial, não só por estra a ssociada a doenças muito limitantes, mas também por estas estarem a aumentar a sua prevalência com o envelhecimento populacional.
Tratamento habitual é com recurso a opiáceos, antidepressivos ou anticonvulsivantes, sendo que os primeiros são os mais eficazes nas dor severa, mas são muito associados a comportamnetos aditivos e morte por overdoses. Devido às desvantages dos opiáceos, os cannabinoides foram propostos como alternativa no tratamento, porque há evidências que nos tecidos lesionados as células neuronais e não neuronais produem endocanabinóides (AEA e 2-AG), que vão modular a resposta nocicetiva normal.
A ação do THC na dor crónica passa por uma ação complexa, que inclui:
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Inibição da síntese de Pge2 e estimulação das lipoxigenases;
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Diminui a libertação de 5HT pelas plaquetas e uptake na fenda sináptica, por outro lado aumenta a sua síntese no cérebro;
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Afeta o sistema trigeminovascular, diminuindo a incidência das enxaquecas;
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Altera a função dopaminérgica;
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Inibe a libertação pre-sináptica de glutamato, diminuindo a sua excitotoxicidade e
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Ativa TRPV2, 3, 4 e 5 (recoetores associados a canais iónicos) e TRPM8 (recetor associado a um canal permeável ao cálcio).
Ação CBD:
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Agonista TRPV1 e capsaicina;
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Inibe FAAH, que hidrolisa a anandamida (endocanabinóide), e inibe o reuptake da mesma;
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Inibe o metabolismo hepático de THC a 11-hidroxi-THC, aumentando com isto o tempo de vida do composto ativo e não se forma o metabolito mais ativo, mas que causa também mais efeitos secundários;
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Efeitos antinflamatórios:
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Diminui ROS, TNF-alfa e citoquinas pro-inflamatórias;
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Induz apoptose das células T;
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Inibe a proliferação das células T;
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Redução da migração e adesão das células imunes, reduzindo o stress ocxidativo e inflamtório na área de “dor”.
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Apesar de o CBD ter uma afinidade mais baixa para os rectores canabinóide, ao inibir FAAH, eleva a quantidade de anadamida (endocannabinóide), que têm uma elevada afinidade para os rectores, em especial CB1. [2]
Síndrome de Gilles de la Tourette
O uso de canabinóides no síndrome de Gilles de la Tourette ainda não é completamente compreendido, mas estudos feitos com a administração de THC, revelaram uma melhoria no tratamento dos tiques característicos desta patologia e uma melhoria nos distúrbios comportamentais que os pacientes experienciavam, quando comparados com o placebo.
Há a expeculação de que a ação dos canabinóides no síndrome de Tourette é pela sua ação nos rectores CB1 centrais, já que estes se encontram em maior densidade noc gânglios da base, cerebelo e hipocampo, tudo locais associados à patologia. Para além disto, há evidências da interação entre o recetore CB1 e o sistema dopaminérgico e outros sistemas excitatórios neuronais, mas como a sua relação é muito complexa ainda não se sabe qual o papel que eles podem ter na patologia. [3]
Epilepsia e tratamento de transtornos convulsivos graves da infância (síndromne de Draver e Lennox-Gastaut)
A epilepsia parece estra associada a uma disfunção do sistema endocanabinoide, particularmente por um aumento da neuroinflamação. Esta aprece de uma reposta fisiológica, mediado pelas células de glia (céluals imunes residenrtes no SNC, que protegem as outras células neuronais), a um estímulo ou lesão. No caso da epilepsia, esta resposta natural parece estar em sobreexpressão ou com incapacidade de regulaç#ao, causando uma resposta desregulada no cérebro. Como o sistema endocanabinóide é um dos maiores eixos do SNC o seu envolvimento nesta patologia é suspeito. [5]
As evidências terapêuticas parecem estar relacionadas com a diminuição da neuroinflamação nesta patologia. [4]
THC, atua por:
- ação anti-inflamatória por agonismo parcial CB1 no CNS;
- ação anti-inflamatória por agonismo parcial CB2 nas células microglia no SNC (células imunes residentes no SNC);
- efeito antioxidante ;
- reduz a libertação de citoquinas pro-inflamatórias (TNF-alfa, NO, IL-1 e IL-6), aumenta a libertação de citoquinas anti-inflamatórias (IL-4, IL-10 e IL-1a) por mecanismos dependentes de CB1 e CB2, nas células de glia e nos neurónios;
- ativa de forma transiente e dessensibiliza os TRPA1, TRPV1 e 2, a dessensibilização ajuda à downregulation da hiperexcitabilidade neuronal . [4]
CBD:
- baixa afinidade para CB1 e CB2;
- agonista TRPV1, 2 e TRPA1 e dos recetores 5HT1a e da glicina;
- antagonista de TRPM8, recetores de cálcio tipo T e GPR55;
- em condições de elevada excitabilidade neuronal o CBD vai reduzir o cálcio uintracelular, parecendo ser por ação num transportador mitocondrial;
- ao antagonizar o GPR55, vai diminuir as concentrações intracelulares de cálcio, o que leva auma menor fusão de vesículas com neurotransmissores excitatórios hipocampo;
- reduz a libertação de glutamato, menos excitotoxicidade;
- inibe a recaptação de adenosina, por bloquieo de transportador ENT1, aumentando os níveis extracelulares de adenosina, que por sua vez diminuiem a hiperexcitabilidade neuronal;
- inibe o cana VDAC1, que é dependente da voltagem, levando a um efeito supressivo, por diminuir a condução e dessa forma diminui a neuroinflamação; [5]
- CBD também têm capacidade de inibir a degradação de AEA e a sua degradação via FAAh, elevando a suas concentrações, que estão diminuidas no LCR de pacientes com epilepsia[4,5];
- limita a inflamação e stress oxidativo por reduzir a toxicidade oxidativa causada pelo excesso de glutamato e aumenta adenosina, que se vai opor à inflamação induzida por lipopolissacarídeos e TNF-alfa;
- ativa PPAr-gama, reduz a libertação de NO e IL-beta e retringe a neuroinflamação. [4]
THC e CBD têm uma atividade inbidora da COX-2, que por um lado vai diminuir a formação de prostaglandinas pro-inflamatórias e por outro lado vai diminuir a degradação dos endocanabinóides, pela mesma, potenciando os efeitos. Têm assim uma atividade direta de aumentarem os níveis de endocanabinóides e uma atividade anti-inflamatória indireta, contribuindo para a atividade antiepiléptica.
Glaucoma resistente à terapêutica
Glaucoma compreende um conjunto de patologias oculares que podem levar a cegueira progressiva e/ou irreversível, por aumento da pressão intraocular, dano progressivo das células ganglionares da retina (RGCs), levando a dagenração do nervo ótico. Esta morte das RGCs pode ser devido a defeitos na coneção entre o SNC e a retina, como por exemplo, células de glia reativas, defeito no transporte e conetividade axonal, privação do fator neurotrópico, ativação de sinalização pro-apoptótica, stress oxidativo e excitotoxicidade.
Clinicamente o THC e outros canabinóides diminuem a presssão intraocular por atuação direta nos rectores CB1 , reduzindo entre 25-30% e também por modulação da produção (redução de cerca de 18%) e drenagem do humor aquoso. [6,7]
Ação mais direta:
- ação direta dos canabinóides no rectores CB1 ocular, reduzindo a pressão intraocular;
- THC diminui a secreção de secreções ciliares e leva à vasodilatação ocular (possivelmente por um processo beta-adrenérgico), promovendo uma drenagem do humor aquoso;
- diminuição da produção do humor aquoso, por inibirem o influxo de cálcio nos neurónios adrenérgicos pré-sinápticos, reduzindo a llbertação e estímulo noradrenérgico no corpo ciliar. [7]
No entanto, mais recentemente foram propostas outras formas de envolvimento na patologia mais indiretas:
- redução da excitotocidade NMDA ativada pelo glutamato, presente em muitas vias de apoptose celullar, diminuindo os níveis de peroxinitrito e sretess oxidativo relacionado com o neurotransmissor, protegendo a retina; [6,7] inibição da libertação do ácido glutâmico por aumento da permeabilidade ao potássico e reduzindo a ao cálcio (meno rfusão das vesículas glutamatérgicas), para além disto parecem conseguir bloquear os rectores de glutamato NMDA; [7]
- propriedades antiinflamatórias, por aumnetar as concentrações de adenosina, por equilibrar o transportador de adenosina, modelar o recetore A2A e suprimir a libertação de TNF-alfa induzida por lipopolissacarídeos;
- efeitos na modulação da degradação dos endocanabinóides, potenciando os seus efeitos. [6]
Bibliografia:
[1] Suryadevara U, Bruijnzeel D, Nuthi M, Jagnarine D, Tandon R, Bruijnzeel A. Pros and Cons of Medical Cannabis use by People with Chronic Brain Disorders. Current Neuropharmacology. 2017;15(6).
[2] Breijyeh Z, Jubeh B, Bufo S, Karaman R, Scrano L. Cannabis: A Toxin-Producing Plant with Potential Therapeutic Uses. Toxins. 2021;13(2):117.
[3] Müller-Vahl K. Treatment of Tourette Syndrome with Cannabinoids. Behavioural Neurology. 2013;27(1):119-124.
[4] Rosenberg E, Tsien R, Whalley B, Devinsky O. Cannabinoids and Epilepsy. Neurotherapeutics. 2015;12(4):747-768.
[5] Kwan Cheung K, Peiris H, Wallace G, Holland O, Mitchell M. The Interplay between the Endocannabinoid System, Epilepsy and Cannabinoids. International Journal of Molecular Sciences. 2019;20(23):6079.
[6] Rapino C, Tortolani D, Scipioni L, Maccarrone M. Neuroprotection by (endo)Cannabinoids in Glaucoma and Retinal Neurodegenerative Diseases. Current Neuropharmacology. 2018;16(7):959-970.
[7] Tomida I. Cannabinoids and glaucoma. British Journal of Ophthalmology. 2004;88(5):708-713.